segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Como parei de fumar


Personalidades revelam como conseguiram se livrar do vício que atormenta 25 milhões de brasileiros. Qual estratégia combina com você?
Cristiane Segatto -  Revista Época -05/12/12
Meu primeiro cigarro foi presente da indústria do tabaco. Tinha 14 anos quando fui abordada na porta da escola, na Zona Norte de São Paulo, pela propagandista de uma marca nova. A moça era mais bonita, mais velha e, sobretudo, parecia mais segura que eu. Vestia um macacão fashion, com um grande bolso na altura do peito. De lá, tirou uma amostra grátis com três cigarros e me ofereceu. Naquele instante, de nada adiantou ter sido educada numa família não fumante. Enfiei a caixinha no bolso e corri para o quintal de casa. Sentada no chão e torcendo para ninguém aparecer, acendi um cigarro. Por sorte ou por genética, tossi, odiei o sabor e a experiência. Nunca mais tentei.
Poderia ter sido diferente. Hoje, poderia ser um dos 25 milhões de brasileiros dependentes de nicotina. A maioria luta para se livrar do vício e fracassa. Sou do tempo em que a indústria se achava no direito de viciar crianças na porta da escola. Daquela tarde de1984 para cá, muita coisa mudou. Leis foram aprovadas para inibir a propaganda e o consumo de cigarros. A população fumante caiu de 35% em 1989 para 15% em 2011. Cresceu a consciência sobre os males do tabagismo, a principal causa evitável de morte em todo o mundo. Um em cada dois fumantes morre de doenças cardiovasculares, câncer e uma lista enorme de males associados ao vício. São 5 milhões de óbitos por ano – 200 mil deles no Brasil.
Para ajudar os que decidiram se livrar do vício, ÉPOCA selecionou histórias inspiradoras de personalidades que abandonaram o cigarro. Eles serão dependentes para sempre, mas, no momento, são exemplos de sucesso. As estratégias adotadas são as mais variadas. Elas demonstram que não existe uma fórmula única e vencedora. Um fenômeno, infelizmente, não se alterou: a idade precoce da primeira experiência. Em algumas capitais, ela ocorre por volta dos 13 anos. No interior, aos 10. O vício se instala na adolescência, antes que o indivíduo tenha maturidade para tomar decisões conscientes. Fumar ou não fumar não é, ao que parece, questão de escolha.
Drauzio Varella { 68 ANOS } - Médico
"Comecei a fumar aos 17 anos. Era tímido e nunca sabia o que fazer com as mãos nas festinhas. O cigarro me ajudava a sentir segurança. Tinha prometido parar quando começasse a tossir – acho horrível a tosse de fumante. Um dia voltei do trabalho e encontrei minhas filhas (na época com 4 e 2 anos) me esperando no hall do elevador. Morávamos no 10º andar. Elas disseram que sabiam que eu estava chegando porque reconheciam minha tosse. Ouviam o som desde lá de baixo. Era cancerologista e vivia com o maço de cigarros no bolso. Que moral tinha para mandar o paciente parar? Decidi parar na noite em que eu e um amigo que havia infartado fumamos dois maços. Nos primeiros dias, sentia vontade, ficava irritado. Não usei remédio, adesivo, nada. Parar foi fácil. O difícil foi tomar a decisão. Passei os 12 anos seguintes pedindo para meu irmão (o médico Fernando Varella) parar. Ele não parou e diagnosticou nele mesmo um câncer de pulmão. Em nove meses, estava morto."
Neto {45 ANOS }  - Ex-jogador de futebol
"Tinha 17 anos quando comecei. Fui lá, comprei um maço, gostei e não parei mais. Fumei até os 38, todo o período em que joguei. Nunca tinha tentado parar. Até que uma história mexeu comigo. Jogava truco toda segunda-feira com amigos de Santo Antônio de Posse, e um deles comentou que o médico tinha dito ao Edmur, um amigão meu, que ele tinha cinco anos de vida se parasse de fumar. Ele morreu 15 dias depois. Abri a janela e joguei o maço de cigarros fora. Nunca mais fumei. Não quero que minha filha perca o pai por causa de cigarro. Mas é só falar em cigarro que dá água na boca. Não acredito em nenhum desses métodos. O que manda é a vontade."
(Washington Olivetto { 60 ANOS } - Publicitário e presidente da agência WMcCann
"Comecei a fumar aos 18 anos, logo que entrei na faculdade. Queria impressionar as meninas. Na época, as mulheres estavam começando a fumar, e eu não tinha cigarro a oferecer. Aí resolvi provar também. Fumei um maço e meio até 2001, quando fui sequestrado. Fiquei 53 dias confinado sem nem um cigarro sequer. E não me importei. Estava angustiado com coisas muito mais importantes que meu vício. Logo que saí dali, pensei que tiraria pelo menos alguma coisa boa daquilo tudo, e não fumei mais cigarro. Desde o sequestro, só fumo charutos. Elejo datas muito especiais, como meu aniversário, Natal e Ano-Novo, e, mesmo assim, fumo bem pouco. Tem uma conotação diferente de consumo, é outra história. A legislação brasileira para a publicidade do cigarro é bastante adequada. As pessoas devem ter senso crítico para decidir o que querem fazer. Vale refletir sobre um raciocínio simples: uma coisa que custa menos de R$ 4 e vem em 20 unidades não pode ser boa para você."
João Gordo { 47 ANOS } - Apresentador de TV e músico
"Comecei a fumar aos 15, com uns moleques punks, e fumei três maços por dia por 20 anos. O cigarro é a droga mais forte que existe, pior que heroína e cocaína. Já cheguei a ir a pontos de ônibus na madrugada para pegar bitucas no chão. Parei em 2000, quando tive um derrame pleural e fiquei 23 dias internado. Foi uma combinação de drogas com obesidade mórbida e uma costela quebrada. Mas foi o cigarro que me assustou. O médico tirou do meu pulmão 900 mililitros de nicotina com sangue – vi aquilo e fiquei traumatizado. Decidi parar. Não tive recaídas e sentia náuseas com o cheiro da fumaça. Mas bastou colocar um cigarro na boca para tudo voltar. Fumei escondido da minha mulher por três anos. Só melhorei no ano passado, depois de uma psiquiatra me receitar um ansiolítico. O remédio segura a barra, mas ainda é complicado parar de uma vez. A indústria do cigarro devia fechar suas portas e indenizar."

Bom Retiro terá complexo para viciado em crack

Espaço tem condições de abrigar todos os dependentes da cracolândia, diz secretária
Em janeiro, a Prefeitura de São Paulo vai inaugurar um complexo de acolhida para usuários de crack a pouco mais de um quilômetro da cracolândia, no final da rua Prates, no Bom Retiro (centro).

Com 12 mil m² -área equivalente a três campos de futebol-, o local será o primeiro a agrupar equipamentos de assistência social e de saúde.
Terá centro de convivência com quadra poliesportiva, biblioteca e jogos, albergue para 120 pessoas, AMA (Assistência Médica Ambulatorial) e Caps-AD (Centro de Apoio Psicossocial Álcool e Drogas). O terreno era um antigo estacionamento de ônibus e já pertencia à prefeitura.
Entre reformas e construções, a Secretaria de Assistência Social diz ter investido no projeto cerca de R$ 5 milhões.
A AMA e o Caps terão 120 profissionais da saúde e 11 leitos para internação e observação. Funcionarão 24h.
Segundo a secretária Alda Marco Antônio, o centro de convivência terá capacidade para 1.200 pessoas. "Se todos da cracolândia quiserem vir, esse espaço tem condição".
Esse centro, afirma ela, tem o objetivo de atrair os usuários para um ambiente onde tenham contato com assistentes sociais e agentes de saúde, que tentarão identificá-los e convencê-los a permitir acompanhamento psicossocial.
A segunda etapa, explica, é convencê-los a dormir no albergue. Depois, com o dependente mais habituado a uma rotina de banho, refeição à mesa, TV, diz Alda, é possível entrar em contato com a família e tentar a reaproximação. Se a pessoa for de outra cidade, o Estado vai ajudar no contato.
Agentes da prefeitura farão um trabalho de aproximação e convencimento, para tentar levar usuários de crack até o local. A decisão tanto de entrar quanto de sair, a qualquer momento, é do usuário, diz Alda.
Mas os médicos do Caps têm a liberdade de decidir se o caso é de internação involuntária -quando o dependente é uma ameaça para a própria vida ou de outra pessoa. Basta que emitam laudo e comuniquem a Promotoria.
ILHA
Para a psiquiatra Ana Cecília Marques, da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras drogas, a ideia de uma "ilha do crack" assusta. "Não sou a favor de locais que estigmatizam. Isso pode virar um depósito [de viciados]."
Os recursos usados, defende ela, seriam mais bem aplicados no treinamento das equipes de CAPs e AMAs que já existem no entorno. Mas ela vê como positiva a criação de um albergue para usuários de crack, pois unidades comuns não costumam aceitá-los.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Epidemia do crack ganha plano de emergência

Diário de São Paulo - 08/12/2011

Governo Federal apresenta projeto de combate à droga, que já é a mais consumida no estado de São Paulo Reinaldo Chaves/Agência BOM DIA

O crack já é a droga ilícita mais consumida no Estado de São Paulo, em municípios de todos os portes. O governo federal lançou ontem  um novo plano nacional para o enfrentamento do crack, com ações importantes, porém, com propostas já apresentadas em outras oportunidades e também insuficientes para o Estado.

No primeiro semestre deste ano, a Frente Parlamentar de Enfrentamento ao Crack mostrou que em 79% dos municípios paulistas há falta de leitos hospitalares do SUS (Sistema Único de Saúde) destinados aos dependentes químicos.

O plano federal lançado ontem, chamado de “Crack, é possível vencer”, prevê investimentos de R$ 4 bilhões da União. Até 2014, o Ministério da Saúde repassará recursos para que estados e municípios criem 2.462 leitos. Muito pouco diante da magnitude do problema. O Ministério da Saúde não informou quantos leitos estão previstos para São Paulo.

Ana Cecília Marques, psiquiatra da Abead (Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas), estima que no Estado de São Paulo há pelo menos 6 milhões de usuários de drogas. “A única pesquisa nacional abrangente, de 2007, feita pelo Cebrid [Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas], com dados só do álcool, mostra a necessidade de cerca de 200 mil leitos. Ou seja, temos no Estado um déficit gigantesco de leitos”, comenta.
Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, há 400 leitos de internação e só 68 CAPSad (Centros de Atenção Psicossocial - Álcool e Drogas) no Estado.

Falta de gestão
Os CAPSad realizam tratamento ambulatorial com verba do governo federal. O governo estadual só capacita os profissionais que trabalham nestes locais.

A instalação de um CAPSad depende da apresentação de um projeto por parte do município. Ana Cecília conta que muitas vezes existe a verba federal para esse fim, mas as cidades não vão atrás. “Isso ocorre porque a maioria das cidades paulistas não possui dados precisos sobre as drogas, então nem conseguem pedir verbas. É um problema grave de gestão”, diz.

O governo estadual afirma que vai ampliar os leitos de internação. A meta é criar mais 400 até 2012 com investimento de R$ 200 milhões. Segundo a Secretaria de Saúde, é realizado um trabalho de mapeamento de áreas com mais necessidade de atendimento. A cidade de Botucatu e o Hospital das Clínicas de São Paulo foram os primeiros locais escolhidos.

Medida prevê sistema de informações
A presidente Dilma Rousseff e o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) anunciaram ontem também que será feito um serviço de levantamento de dados para definir número de usuários e o funcionamento do consumo em locais de concentração do comércio de crack. Será criado ainda o Sinesp (Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas)  sobre a situação da segurança pública no país.

Governo quer uso maior de bens do tráfico
Ontem também foi anunciado o envio ao Congresso do projeto de lei para agilizar o processo de alienação dos bens que são produto do tráfico de drogas. A mesma proposta vai dar mais agilidade no procedimento de destruição de drogas apreendidas.

Internação à força passa a ser aceita pelo governo
Um ponto polêmico da luta contra às drogas, a internação involuntária de usuários, foi abordado ontem em Brasília na apresentação do plano “Crack, é possível vencer”. Segundo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, serão criados 308 Consultórios de Rua, com médicos, psicólogos e enfermeiros, que farão busca ativa de dependentes e avaliarão se a internação pode ser voluntária (com o aval do usuário) ou involuntária (contra a vontade do paciente).

“A própria lei autoriza esse tipo de internação por medida de proteção à vida. Os Consultórios de Rua farão uma avaliação sobre o risco à vida da liberação do dependente químico”, disse o ministro, ontem, durante o evento.

Outra ação do governo será facilitar o acesso por telefone a informações sobre drogas. O atendimento telefônico VivaVoz, que auxilia e orienta usuários e familiares de dependentes, passará de 0800 para o número de três dígitos 132. Mais informações no site www.brasil.gov.br/enfrentandoocrack.