terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Você é a favor ou contra a legalização da maconha? Duelos de Opinião

Henrique Carneiro e Ana Cecilia Marques discutem quais são os prós e contras da regulação da droga



Disponível em: http://operamundi.uol.com.br/conteudo/opiniao/32791/voce+e+a+favor+ou+contra+a+legalizacao+da+maconha+duelos+de+opiniao+-+video.shtml


Nova York sanciona Lei para inibir a dependência do cigarro


Lei que restringe a compra de cigarros por menores de 21 anos e sobe o preço do maço deveria ser exemplo para o Brasil
 
Na última terça-feira, o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, sancionou uma lei que proíbe a venda de cigarros para menores de 21 anos. Os adolescentes ainda podem portar o tabaco, mas a iniciativa tem o objetivo de minimizar o número de jovens que experimentam o cigarro na idade em que estão mais vulneráveis à dependência. As pesquisas apontam que 80% dos fumantes iniciaram o hábito antes dos 21 anos.
 
O preço do maço de cigarros por lá também aumentou e passou a custar no mínimo US$ 10,50. A venda para menores implicará em multas de até US$ 1 mil, podendo chegar a US$ 2 mil se for reincidência e até mesmo perder a autorização de venda do produto.
 
Para a presidente da Associação Brasileira do Estudo do Álcool e Outras Drogas (ABEAD), Ana Cecília Marques, essa medida teria grande importância no Brasil. “Esse é o tipo de legislação eficiente. Protege os indivíduos com maior vulnerabilidade à dependência. Está comprovado que o consumo do tabaco por crianças, adolescentes e até mesmo ‘adultos jovens’, potencializa as possibilidades de estabelecer a dependência. Não temos dúvidas de que esta Lei é um exemplo que deveria ser seguido no Brasil. Sabemos que haverá ainda a venda no mercado negro, mas também sabemos que o adolescente de 16 anos terá ainda mais dificuldade para comprar, e o aumento no custo é outra medida importantíssima”, destaca a psiquiatra.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Turma da Mônica irá conviver agora com a cerveja como se fosse um hábito transgeracional



A AMBEV, dona de marcas de cerveja como Skol, Antarctica, Brahma e Budweiser, lançou recentemente no mercado a campanha “Papo em Família”, que consiste em um material (cartilha, vídeo, tirinhas) da Turma da Mônica para falar sobre a idade certa para o consumo de bebidas alcoólicas.

Segundo a presidente da ABEAD (Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas), Ana Cecília Marques, é inadmissível ter o Cebolinha, um dos personagens principais das histórias infantis aprendendo sobre a hora certa de ingerir bebidas alcoólicas, tratando a cerveja como se fosse leite. “O Cebolinha faz parte do imaginário coletivo brasileiro, e vê-lo convivendo com a cerveja, até hoje considerada por muitos uma bebida mais fraca, é uma péssima influência, principalmente por passar a ideia que ela é quase como se fosse água para matar a sede, o que sem dúvida é influência negativa”, afirmou a psiquiatra.

A peça ainda retrata os parentes do Cebolinha na trama, colocando na figura do pai o papel de definitivamente inserir a cerveja na mesa da família brasileira, justamente em casa, local onde deveria prevalecer a prevenção, principalmente ao lidar com jovens. “Não é de hoje que a indústria do álcool traça estratégias para garantir a clientela das novas gerações, mas mexer com o lúdico das crianças já é demais”, comentou Ana Cecília Marques.

Além da tão usada mensagem que coloca “a bebida alcoólica como um produto qualquer”, depois daquela que insiste que “é só beber com moderação”, a campanha reforça uma nova vertente ao dizer que “o produto pode ser um hábito transgeracional, parte da cultura familiar”. Daqui a algum tempo, poderá se transformar em um valor familiar, indo mais além da família, atingindo seu entorno, pois lá também estão os amigos do Cebolinha. “Será que agora só nos resta esperar que por meio de suas propagandas inescrupulosas eles transformem a Mônica e suas amiguinhas em super mulheres, sensuais e poderosas, fantasiando que a bebida alcoólica é um produto que tem esse poder, e rapidamente nossas adolescentes irão bater todos os recordes do abuso e da dependência?”, indaga a presidente da ABEAD. “Onde estão os órgãos que controlam as propagandas? E diante de um crime tão contundente, vamos indiciar a indústria de bebidas alcoólicas ou o pai e a mãe do Cebolinha?”, conclui.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Síndrome do alcoolismo fetal e consequências para o bebê

Liberação da maconha divide opiniões no Brasil

Enquanto no Uruguai a regulamentação da maconha ganha tratamento de política pública, no Brasil a discussão está longe de receber impulso oficial. Mas o assunto ganha as ruas, e a força do antagonismo entre prós e contras também. Os dois lados são capazes de enxergar perspectivas completamente opostas em relação, por exemplo, ao futuro do tráfico de drogas. Um comércio estruturado desmantelaria os pontos de tráfico ou reforçaria a venda paralela, que fugiria dos impostos? Essa é uma das incertezas.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tornou-se um paladino da liberação, com manifestações em artigos, palestras e programas na TV. FH também foi um dos primeiros a declarar adesão à política oficial de drogas na iminência de ser adotada pelos uruguaios.
O maior temor das vozes que tentam desestimular abordagens inspiradas na iniciativa inédita do governo José Mujica é a possível amplificação de um problema de saúde pública. O acesso facilitado cria as condições para viciar um número maior de pessoas (veja os números do consumo no Brasil no quadro abaixo) e abre as portas para o envolvimento de um número maior de usuários com drogas mais pesadas. Críticos como o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp), definem a iniciativa como "aventura" com consequências imprevisíveis para a saúde pública.
A presidente Dilma Rousseff teria coragem de colocar o tema sobre a mesa? A resposta foi dada pelo próprio Mujica, em entrevista que concedeu a Zero Hora na terça-feira:
- Ela (Dilma) tem muito medo pelas dimensões do Brasil. Não vê outro caminho a não ser reprimir, agora.
Conheça argumentos de quem defende e de quem rejeita um teste como o uruguaio no Brasil:
POR QUE SIM
As palavras a seguir constam em um artigo assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em referência à própria atuação na Comissão Global de Política sobre Drogas: "Apoiamos a busca de modelos de regulação legal porque acreditamos que reduzirão o poder do crime organizado e ajudarão a proteger a saúde e a segurança das pessoas". Foi o texto no qual FH declarou adesão à legalização da maconha pelo Uruguai e reconheceu o fracasso das políticas de proibicionismo, um meio de "desperdício de recursos públicos inestimáveis".
Quer dizer: se não adianta reprimir, melhor buscar alternativas. E a mais adequada delas, segundo os defensores da causa por aqui, seria tirar a erva da ilegalidade, torná-la controlada, enfraquecer o crime organizado privando-o de uma fonte de recursos explorada em regime de monopólio.
O conjunto desta obra formou um lobby bem organizado, fato reconhecido até por quem tem pesadelos com a maconha livre. A causa angaria apoio de figuras públicas, principalmente na classe artística, mas encontra certa resistência em políticos. Principalmente porque ainda há muito conservadorismo, afirma a jornalista Soninha Francine, candidata a prefeita de São Paulo pelo PPS nas eleições de 2012. Ela compara a maconha à adoção do divórcio, em 1977. Aprová-lo, lembra, seria inimaginável. Mas aconteceu e, hoje, ninguém se recorda da polêmica.
- Não vejo outro caminho, pela dimensão do Brasil, a não ser trazer (a maconha) para o nosso mundo, das leis - opina Soninha.
Ela elogia e defende o modelo uruguaio. Não vê problemas em, no Brasil, incluir a erva em um regime de produção agrícola, com normas, rotulagem, controle. Seria um produto como qualquer outro, com nota fiscal e arrecadação de impostos. Soninha pondera: pode haver danos à saúde — e o paralelo vale para cigarros e bebidas alcoólicas. Daí a necessidade de se enquadrar a maconha em uma série de obrigações, com restrições de venda para menores, consumo e publicidade.
Um modelo assim já é realidade em Washington e Colorado, nos Estados Unidos, e quase duas dezenas de outros Estados permitem o uso medicinal da maconha. A legalização parcial, como o viés medicinal americano, é considerada hipocrisia pelo ator José de Abreu, da Rede Globo, que está entre os artistas sem receios de abordar o tema.
- Já que é impossível lutar contra, melhor assumir - prega.
Geração de debates
Abreu diz que pensou em tentar vaga na Câmara dos Deputados pelo PT, ano que vem, com a bandeira da legalização. Desistiu porque, conta, meio fanfarrão, meio sério, "o problema é se eu ganhar: não posso ficar quatro anos sem atuar (como ator)". Mesmo sem um cargo legislativo, ele não se esquiva de defender aspectos positivos que surgiriam a partir da erva livre, como o enfraquecimento do tráfico. O raciocínio é simples:
- Quem não quer a liberação ou a organização desse tráfico são os traficantes, o pessoal que ganha dinheiro com droga.
Não seria a realidade dos usuários, diz Abreu. Hoje, muitos deles flagrados com pequenas quantidades de maconha ainda são confinados em presídios, ocupando vagas destinadas a quem assalta e mata.
Na nova realidade, diz Soninha, o governo atuaria não para impedir uma transação comercial, mas a fim de combater desvios. E a criminalidade cairia. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) não arrisca previsão, embora tenha dúvidas se o mercado criminoso necessariamente ganharia com a maconha livre. Nesta segunda-feira, ele irá ao Uruguai para "estudar bem a experiência" que vê "com bons olhos". Sobre legalização no Brasil, afirma o seguinte:
- Estou aberto para debater o tema.
As conversas devem ser longas. Para Soninha, a maconha ainda levará uma geração até ser liberada no Brasil. José de Abreu crê ser difícil o governo federal abraçar a bandeira. Sobre isso, comenta, bem-humorado:
- Transatlântico não faz curva fechada.
 POR QUE NÃO
Porta de entrada para outras drogas, a maconha legalizada impulsionaria o consumo de entorpecentes no Brasil, em um movimento capaz de fortalecer redes de traficantes e impactar a saúde pública - principalmente entre os mais jovens. Em resumo, este é o argumento das vozes que se posicionam de forma contrária a qualquer projeto semelhante ao proposto no Uruguai.
Falamos de gente já conhecida em debates sobre o tema, como o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp). Ao traçar um paralelo com a experiência uruguaia, ele define como "uma aventura com a próxima geração", uma espécie de experimento social sem a assinatura de termo de consentimento. Em português mais explícito, é como se a população se tornasse cobaia de um mercado estatal. Se algo parecido acontecesse por aqui, afirma, teríamos problemas generalizados.
- A maconha está relacionada a uma piora do rendimento escolar, da memória, de concentração. Estudos na Nova Zelândia mostram queda no Quociente de Inteligência (QI) de quem usou na adolescência. Aumenta risco de transtorno psicótico - afirma Laranjeira.
- É um impacto que vai dar medo - avalia a psiquiatra Ana Cecília Marques, professora da Unifesp e presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead).
Diz ela que outro trabalho acadêmico, este americano, apontou que consumidores de maconha apresentaram maiores índices de depressão, esquizofrenia e abandono acadêmico, na comparação com quem não tem o hábito de fumar a erva. Trata-se de um quadro definido como transtorno mental definitivo pelo deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), médico e autor de projeto de lei conhecido como lei antidrogas. Aprovado na Câmara e à espera de apreciação no Senado, o texto prevê internação compulsória de usuários para desintoxicação, com prazo máximo de 90 dias. Segundo Terra, que já foi secretário estadual de Saúde, a média para "limpar" o organismo de drogas, no Estado, leva 21 dias. E ainda há riscos de recaída devido à abstinência. Por isso, o temor da legalização da maconha.
- Vamos ficar com um exército de jovens dependentes químicos - projeta.
Alerta na saúde
Para Terra, o tráfico fica em segundo plano diante da questão da saúde. Mas nem por isso acaba esquecido. Conforme o delegado da Polícia Federal Cezar Luiz Busto de Souza, coordenador geral de Polícia de Repressão à Droga, 70% do mercado brasileiro de maconha é abastecido pelo Paraguai. Nas palavras dele – que prefere não se posicionar sobre a legalização –, trata-se de "uma droga que preocupa demais".
Mais: tanto Terra quanto o psiquiatra Laranjeira projetam crescimento do mercado ilegal pela simples premissa de que o traficante cobraria menos pela maconha, em relação a quem paga imposto e vende com nota fiscal. Também questionam como seria fiscalização, inclusive das plantações caseiras. Em resumo: nasceria o descontrole.
- Não estamos falando de uma plantinha, mas de dinheiro, poder. O Brasil tem clima para plantar maconha até no meu apartamento - afirma a psiquiatra Ana Marques.
O psiquiatra gaúcho Sérgio de Paula Ramos, consultor da Abead, palestrou há três semanas no Congresso uruguaio. E garantiu: a liberação do consumo de maconha vai fortalecer o narcotráfico. Ele ressaltou que não se trata de "achismo", mas de estatística: em Portugal, que há 12 anos liberou o porte da marijuana, o consumo dessa erva dobrou. E o de outras drogas passou de 7% da população para 12%, ressalta Ramos. Outros países que tinham adotado legislação liberal, como a Inglaterra, voltaram atrás e agora proíbem o consumo da maconha, diz o médico.

- Me parece que o capitalismo selvagem vê o Uruguai como um grande laboratório para negócios. Uma porta para venda legalizada de drogas. Esses são os fatos, o resto é poesia - conclui Sérgio de Paula Ramos.

Segurança e liberdade impulsionam o autocultivo da maconha

Conforme uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), cerca de 1,5 milhões de brasileiros fumam maconha todos os dias. A prática do autocultivo da maconha vem somando adeptos no Brasil, pois as pessoas querem mais segurança e liberdade e por isso cultivam a própria maconha e consomem dentro de suas casas. Contudo, muitos usuários mantêm-se no anonimato e um dos motivos é a ambiguidade da lei 11.343, de 2006, que não determina a quantidade exata de droga que separa usuários e fornecedores.

Alguns usuários da planta optam por fazer o autocultivo, por algumas razões: não se expor a violência nas chamadas “bocas” de drogas (local onde os traficantes comercializam a maconha e outros tipos de drogas) e não fazer uso da maconha vendida pelo traficantes que misturam muitas substâncias tóxicas, o que é chamado de maconha “prensada”. Foi o caso do usuário Leandro Lima, 21 anos, de São Caetano do Sul, que começou a fumar maconha aos 16 anos, por curiosidade e realiza o autocultivo em sua casa há dois anos para fins recreativos. “Comecei a plantar para saber o que estava consumindo, para ter certeza da qualidade da maconha, pela minha saúde, até porque eu não uso agrotóxicos e também eu gosto de cultivar”, afirmou Leandro, que faz o autocultivo em sua casa com a aprovação dos pais. “Eles aceitam, mas não aprovam. Minha mãe, por exemplo, acha melhor essa alternativa, pois cultivar em casa vai me poupar de ir a uma ‘boca’ de fumo”.

Em relação a maconha ser “porta de entrada” para outras drogas, Leandro disse que: “a primeira droga que experimentei foi a espuma da cerveja que meu pai me deu em uma festa quando era pequeno. Não acho que a maconha seja a porta de entrada, o que leva uma pessoa a outras drogas é ir em uma “boca de fumo”, pois lá existem outras drogas além da maconha e são oferecidas para quem vai comprar, isso é um acesso realmente para outras drogas”. Já a psiquiatra e atual presidente da Associação Brasileira de Álcool e Outras Drogas (ABEAD), Ana Cecilia P. Roselli Marques, complementa que no Brasil, não há estudos de que a maconha é mais uma porta de entrada, mas nos Estados Unidos, a maconha é considerada sim, como o álcool e o tabaco.

Mais polêmico que a questão do uso da maconha é a sua legalização, conforme o cientista social Hélio Rios, de 51 anos, a legalização da maconha traria mais aspectos positivos do que negativos. “Com o fim do tráfico, a exemplo do que ocorreu com a lei seca nos Estados Unidos, a violência que decorre dele em muito diminuirá. Os negativos são semelhantes ao uso das drogas lícitas como o álcool que é responsável pela principal causa das violências no trânsito e doméstica.” Hélio é a favor da legalização da maconha no país e acredita que a regulamentação aconteceria seguindo os moldes de como é feita a venda de bebidas alcoólicas, contudo salienta que para ambas as drogas deveriam ter mais critérios de comercialização e uso.
Já a psiquiatra Ana Cecilia afirma que em relação a legalização, o país não tem uma política de drogas que comporte todos os impactos que a maconha pode gerar. Referente aos conflitos que podem ser gerados na saúde pública, a psiquiatra aponta o “aumento do consumo de outras drogas, consumo cada vez mais cedo dos jovens, repercussões e alterações na vida acadêmica (abandono, repetência), alterações no amadurecimento cerebral, aparecimento precoce de transtornos mentais (depressão, pânico e esquizofrenia), alterações orgânicas (bronquite, rinite, entre outras).”

Outro motivo pelo qual o autocultivo da maconha é feito por alguns usuários da planta são para fins medicinais. Assim como Leandro, muitos acreditam nos princípios ativos que podem ajudar no tratamento de muitas doenças, como câncer, glaucoma, epilepsia, entre outros. A psiquiatra aprova o uso da maconha medicinal desde que “sejam produzidas por estudos científicos, cuja metodologia seja bem controlada, isto é, estudos multicêntricos com amostras de indivíduos representativas e controle de todas as variáveis necessárias para tais pesquisas” e conclui dizendo que as pesquisas ainda estão no início. Ou seja, é cedo para afirmar algo conclusivo e fazer o uso indiscriminado da maconha, completa.

Sobre a imagem e opinião que a sociedade criou dos usuários da maconha tanto recreativos como medicinais e também referente a legalização, Ana Cecília, cita a pesquisa do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia para Políticas de Álcool e Drogas, (IMPAD), que a maioria das pessoas não quer a legalização da maconha. Porém, ela afirma que é necessário uma pesquisa que aborde as questões que permeiam a legalização, como as ações e os efeitos da maconha de curto a longo prazo. “Nossa população não tem sido submetida a qualquer medida preventiva, ela não sabe sobre o outro lado da moeda. Acabamos de saber que 60% dos jovens ‘baladeiros’ vão para beber todas, isto é, diversão é igual a intoxicação. Se tivermos mais drogas legais para adultos o que poderá acontecer na balada?”, conclui a psiquiatra.

Em específico sobre a opinião pública no uso da maconha medicinal, o sociólogo Hélio Rios, diz que ainda existe muito preconceito, pois esses usuários são vistos como criminosos e não como doentes que estão tentando outra alternativa para sua enfermidade. E por serem vistos com tanto preconceito, “o poder público se sente confortável por não oferecer nenhuma política de recuperação aos dependentes, mas, sob o apoio da população, trata o problema como caso de política, a exemplo do que vem ocorrendo na cracolândia em São Paulo”, finalizou o sociólogo.

29,9% receberam dinheiro ou drogas em troca de sexo

Se entre os homens o tempo de utilização é mais longo, as mulheres têm maior intensidade e leque de consequências mais amplo. Do total de entrevistadas, 44,5% disseram ter sofrido violência sexual desde que iniciaram o uso do crack. O percentual cai seis vezes entre homens: 7%. Outro dado alarmante é o número de pessoas que recebeu dinheiro ou drogas em troca de sexo: 29,9% das mulheres e 1,3% dos homens.

Para a presidente da Associação Brasileira para Estudo de Álcool e Drogas (Abead), Ana Cecília Marques, os riscos enfrentados na vida sexual de quem utiliza drogas são enormes. “O dependente químico poderá diminuir a noção crítica da realidade. Ele usa a droga, não lembra do preservativo e mantém relações sexuais mesmo assim. Por essa dificuldade de avaliar perigos e realidade, o sujeito estará exposto a uma Doença Sexualmente Transmissível (DST) ou a uma gravidez não programada. Mas devemos lembrar que eles têm situação de alta vulnerabilidade. Provavelmente, sem condição de pensar em situações de contaminação”, diz.

Quase 40% afirmaram não ter usado preservativo em nenhuma das relações sexuais vaginais no mês anterior à entrevista. Para mensurar os danos da dependência química, foram ofertados testes rápidos para HIV e Hepatite C aos entrevistados. Mais da metade deles (53,9%) nunca havia realizado exame para HIV. E, desse número, 5% tiveram diagnóstico positivo.

O secretário nacional de Políticas Anti-Drogas, Vitore Maximiano, classificou o número como “bastante preocupante” e disse que as ações de prevenção devem ser ampliadas. “Na população em geral, o percentual de pessoas com HIV é de 0,6%”. Isso significa que a prevalência da doença entre os usuários de crack é oito vezes maior do que na população geral. (Isabel Costa)

O Crack não é caminho sem volta

Uma das principais revelações da pesquisa realizada pela Fiocruz nas capitais brasileiras é o desejo dos usuários de erradicar a dependência química. Cerca de 80% dos entrevistados afirmaram querer passar por algum tipo de tratamento para eliminar o vício. Diferente do pensamento enunciado pelo senso comum, o crack não é mais um “caminho sem volta”. De acordo com Pedro Daniel Katz, médico psiquiatra do Hospital Samaritano de São Paulo, é possível, sim, encontrar uma “luz no fim do túnel”.

“Se considerarmos que hoje há um consenso de que na abordagem ao paciente portador de dependência química, ao invés de confrontação por perdas já sofridas, devemos trabalhar por diagnóstico multifatorial e tratamentos que considerem motivação para mudança e reforço positivo, reinserção comunitária”, aponta Pedro.
Esse tipo de tratamento, apoiado em abordagem interdisciplinar, está sendo vivenciado nos últimos três meses por Fred (nome fictício). Ele está na sexta internação e garante que, dessa vez, o tratamento vai ser feito por completo. “Estou trabalhando todos os meus sentimentos. Pensei que não precisasse de ajuda, mas, hoje sei que eu preciso, preciso mesmo”. A porta de entrada para o vício foi o álcool, aos 25 anos, depois vieram nicotina, cocaína e, por fim, o crack. “Era uma brincadeira de usar apenas nos fins de semana. Só o sábado. Depois só o domingo. E depois todos os dias. Quando você menos percebe, tem a compulsividade tomando conta de você”.
As outras cinco internações foram propostas pela família, que nunca abandonou Fred. “O crack é muito rápido. São cinco segundos de euforia e depois vem a depressão, automaticamente. Você vai e volta rapidamente. Eu morava em uma área nobre de Fortaleza. O crack vai do playboy ao mendigo. Não tem mais distinção. Tem gente que usa e as famílias não sabem. Quando vão tomar conhecimento já está em um estágio pesado”.
Tratamentos
Entre os entrevistados pela pesquisa, poucos já haviam passado por algum tipo de internação. O serviço mais acessado era o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps-AD), mas somente 6,3% dos respondentes disseram ter recebido atendimento nas unidades. Para Ana Cecília Marques, presidente de Associação Brasileira de Estudos de Álcool e Drogas (Abead), o tratamento da dependência química deve estar baseado em estratégias científicas e com eficácia já testada. “Não adianta ficar inventando. Nós podemos recuperar as pessoas, mas temos que aplicar estratégias que funcionam”.
O tratamento padrão começa com a desintoxicação. Quando as substâncias são eliminadas do corpo e é feito diagnóstico. Inclusive, investigando a presença de outras doenças. Depois, vem a fase de treinamento do indivíduo para que ele aprenda os fatores de risco e estratégias de proteção. Finalmente, ele vai para a fase de inserção social, pois o paciente já deve estar preparado para enfrentar a dependência química no cotidiano, explica Ana Cecília Marques. A médica lembra a necessidade das famílias acompanharem os pacientes. “O tratamento deve ser vistoriado pelos familiares desde o primeiro dia. Por último, o indivíduo vai fazer acompanhamento anual. A dependência é uma doença crônica incurável, que faz o paciente frequentar o tratamento pelo resto da vida”. (Isabel Costa)
Números
·         55% consomem o crack diariamente (uns dias mais, uns dias menos)
·         9,2% dos entrevistados disseram ter feito uso anterior de drogas injetáveis
·         70% compartilham apetrechos utilizados para o consumo da droga
·         7,8% disseram ter sofrido episódio de intoxicação aguda nos 30 dias anteriores à pesquisa

Em 2011, a Fiocruz já havia divulgado levantamento preliminar sobre as cenas de uso do crack nas capitais. Na época, segundo matéria do O POVO, foram identificados 300 pontos de uso na capital e região metropolitana.
A pesquisa mostrou que em algumas cenas de uso das capitais brasileiras podem circular até 3.200 pedras por dia, ou mesmo, 3.200 pedras por turno, considerando que a circulação de usuários se renove por turno. Os pontos de maior porte chegam a ter 200 usuários habituais.
Mais de 70% dos usuários disseram compartilhar os apetrechos utilizados para o uso (cachimbo, lata, copo), o que pode estar associado à transmissão de infecções, especialmente as hepatites virais.