Posicionamento
da Associação Brasileira do Estudo do Álcool e Outras Drogas - ABEAD
A
televisão, em sua condição peculiar de espelho de toda a sociedade, pode
felizmente promover o pluralismo, mas pode ampliar a simples emissão de uma
opinião comprometendo não apenas aquele que a pronuncia. Em uma novela
veiculada no horário nobre, arte que pode ensinar tantas coisas, o que se viu
nos últimos dias sobre o tratamento psiquiátrico no Brasil propaga uma receita
errada, baseada em opinião equivocada.
Embora
o tratamento para dependência de drogas, caso este fosse o diagnóstico da
paciente, não passe nem perto da sala de eletroconvulsoterapia, pois não é
indicada para dependentes, esta terapêutica se mostra segura para muitos casos
de transtornos mentais. O que causa vergonha e indignação nas cenas absurdas
que foram apresentadas nos últimos capítulos da novela Amor a Vida, é que se
cria uma imagem de desumanização no momento mesmo em que se poderia divulgar a
intervenção psiquiátrica como mais um alento para quem experimenta sofrimento.
É
verdade que, de acordo com a lei, um juiz pode decretar a internação
compulsória para indivíduos em risco de morte ou de causar sérios danos à
terceiros, e ainda bem que existe tal possibilidade. Quando necessitam ser
acalmados em seus episódios de agitação, delírio ou agressividade, com o uso de
tratamento medicamentoso, estes indivíduos não babam, não comem com a mão e
muito menos ficam descabelados, quase demenciados; muito ao contrário,
conseguem a calma e repouso necessários para que o cérebro “saia do transe” e
volte a se organizar. Além disso, se internados, os pacientes recebem muitas
outras intervenções, como sessões de terapia, aconselhamento e treinamento
sobre seu problema, exercícios físicos, aulas de música e artes, enfim, um menu
de atividades de acordo com cada plano terapêutico. Tudo isto para que possam
resgatar a autonomia, a autoestima, o equilíbrio, a liberdade de decisão, o
autocuidado e o autocontrole, para que o risco de morte ou de agravamento de
sua doença não rondem mais a sua vida e das pessoas próximas.
Dignidade
humana é reconhecer que somos também determinados pela fisiologia de nossos
corpos, que ainda causa espanto e maravilha tantos neurocientistas por sua
complexidade. A dependência de drogas, como outros transtornos, é uma doença em
que o cérebro tem papel fundamental, que pode ser prevenida, e, apesar de
complexa, é tratável, com boas taxas de recuperação. Colocar inadequadamente
uma forma de tratamento acessível e eficaz para outros problemas, como mera
técnica de exclusão, de forma arbitrária, sem qualquer critério, é prestar um
desserviço ao povo brasileiro, no momento mesmo em que a internação é debatida
no meio político.
A
televisão parece se tornar um enorme bicho de uma cabeça só, que tivesse a
missão de escolher ou esconder diferentes realidades, entre elas, a dificuldade
de fazer valer o direito humano de preservar a vida com modernidade, boas
práticas e respeito!
Ana
Cecília Marques
Presidente
da Associação Brasileira do Estudo do Ácool e Outras Drogas - ABEAD
Gilberto
Lucio da Silva
Vice-presidente
Associação Brasileira do Estudo do Ácool e Outras Drogas - ABEAD
Disponível em: http://www.abead.com.br/noticias/exibNoticia/?cod=911