A cada quatro pessoas com transtornos mentais
internadas contra a vontade em 2013, três passaram por tratamento após ações
judiciais
O alto número de internações
compulsórias de pessoas com transtornos mentais no ano passado acendeu um
alerta no Ministério Público do Paraná (MP-PR). A medida, que prevê o
tratamento contra a vontade do paciente, após uma determinação judicial,
tornou-se regra em vez de exceção nos casos em que o próprio doente não busca
ajuda. Conforme informações levantadas pelo MP-PR na Central de Regulação de
Leitos do governo estadual, foram 93 internações compulsórias em 2013 contra 30
involuntárias – quando o tratamento é recomendado por um médico, sem
necessidade de intervenção da Justiça.
A
internação compulsória, em tese, deve ser usada somente em casos excepcionais,
quando o doente está pondo em risco sua própria vida ou a de familiares, e
também quando já se esgotaram todas as outras alternativas de intervenção
terapêutica. É justamente essa última condição que, na visão do MP-PR, pode
estar sendo driblada devido à falta de estrutura pública de internação por meio
do Sistema Único de Saúde.
“O Judiciário não pode ser a
porta de entrada do SUS. Isso sugere ao MP que temos problemas no sistema. Este
pedido de internação via judicial pode sinalizar uma situação de ausência de
vagas ou outras insuficiências de atenção secundária”, afirma o procurador de
Justiça Marco Antonio Teixeira, coordenador do Centro de Apoio operacional das
Promotorias de Proteção à Saúde.
Na
opinião do procurador, as internações compulsórias forçam ainda mais um sistema
que já é deficitário, causando até a carência de vagas para quem quer se tratar
de forma voluntária - desde 2005, o Paraná reduziu as vagas para atendimento
psiquiátrico em 36%, fechando 2013 com 2.228 leitos pelo SUS. Hoje, a grande
maioria das internações ainda se dá de forma voluntária. A Secretaria de Estado
da Saúde não repassou o número total de internações no ano passado.
Alternativa
A
utilização das internações compulsórias é alvo de críticas de associações
médicas e defensoras dos direitos humanos, que chegam a ver tais ações como uma
forma de “higienização” das ruas –crítica que veio à tona recentemente após as
prefeituras do Rio e de São Paulo passarem a prever a medida para tratar
usuários de crack. “Tem casos em que a internação compulsória precisa ser
aplicada para proteger a vida do próprio indivíduo. Mas só uma equipe
multidisciplinar, envolvendo secretarias de Saúde, Assistência Social e MP,
pode decidir por esse tipo de intervenção, até para evitar abusos”, diz a
psiquiatra Ana Cecília Marques, representante da Associação Brasileira de
Psiquiatria.
Seminário
discute alternativas
O alto
número de internações compulsórias em comparação com as internações
involuntárias – opção que é vista como a preferencial em casos onde não há
concordância do paciente ao tratamento – fez com que o coordenador do Centro de
Apoio Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde Pública do Paraná, Marco
Antonio Teixeira, emitisse uma nota técnica sobre o tema no início do mês a
promotores de todo o estado. A intenção é que os promotores analisem os casos
com rigor e atentem para eventuais deficiências no sistema público de saúde.
A
“judicialização” das internações também será tema do seminário “A atuação do
Ministério Público no enfrentamento à drogadição”, que ocorrerá hoje e amanhã
em Curitiba.
As ações
judiciais que obrigam a internação são usadas para casos de depressão,
bipolaridade e esquizofrenia, mas focam principalmente usuários de drogas. Os
pedidos à Justiça podem ser encaminhados por promotores, defensores públicos e
advogados.
Mobilização
O
seminário que começa hoje na sede do Ministério Público do Paraná, no Centro
Cívico, marca o lançamento oficial do Projeto Semear, ação que pretende
promover a atuação integrada de promotores de Justiça e servidores do MP de
diferentes comarcas do estado com o objetivo de diagnosticar os principais
gargalos e problemas relacionados aos usuários de drogas e implantar políticas
de prevenção. Os grupos regionais de promotores já se encontram desde 2013 e a
intenção é estimular a integração com outros órgãos municipais, estaduais e do
Judiciário, justamente para buscar soluções para dificuldades antigas, como a
falta de vagas para tratamento.
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